terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Morro feliz

As crianças descem na noite a peça
para compor o labor do dia
para fazer a venda,
Os sacos que pesam sobre o sono
são os sonhos dos mulatos recobrados,
é a alma que transcende da gente!

Há de se admirar o povo
que é homem mais que o homem e não simples
pois que tudo se atraca em sua vida.
Em sua vida tudo é tarde, por exemplo,
e o exemplo que lhe cobra a tudo arde
arde a jornada comprida.

As crianças do gueto nunca dormem
sonham sonhos sob sonhos
e os sonhos são as sínteses que sobram
do silêncio de uma imagem de quem dorme.

Os pretos não comem.
Param o ponto no expediente
pensam, não pensam, padecem poentes
parecem pacatos pobres, e o preto não come.

Simultaneamente morre,
no momento presente,
o ser daquele que pulou longe
da encruzilhada favela.
Lá, quem vem na ginga é só quem morde
as rédeas de zinco e ladeira
e passa fome.

A moça equilibrista guarda o morro
modela a paz no canto
E as crianças vivem melhor.
O suor da preta escorre pela pedra
no rosto que remoça o medo,
o escuro manto,
a chuva deixa densa relva...

No dia de São Jorge a alegria!
ávido nasce no côncavo o povo da favela,
o morro acende as luzes e ascende
O samba!
O preto larga suas chagas
a moça pões a saia estampada
as crianças sonham de brincar...
E desafia-se intrépido a lua
que se vai, na cadência da cintura,
em cordões de estrelas cósmicas, pequenas:
Pequenas aos olhos do morro!

A vivenda da gente que não é simples
é torpor e torpor e sorriso.
É o santo que escala as pedras, sobe a viela e bate panelas
para alimentar as bocas famintas.
É o ciso que reclama o terno direito
que exclama no peito de Ogum, com clavas ocas,
pela saúde do pretinho que dorme.

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