quinta-feira, 11 de junho de 2015

Libertinagem


O grito lança meu sufoco fora
Desejo gritar entre os bosques verdes,
abismos, marés de estátuas, mas vedes
a massa que estuda as feições agora.
Tento, em vão, fugir. Mensurar-me em poesia.
Espero o que esmero, esse dia há de chegar,
mesmo que o penar seja o tempo passar,
ao longe o vejo, e não suporto o dia a dia.
As minhas antigas musas vão se indo
com o frio das noites dos tempos breves,
só basta abortar o ódio sorrindo.
Cá, à minguar, tudo peço que me leves
que eu perca o meu grito a ir-se ao ar caindo
nas linhas do tempo, o que, assim, escreves.

Mandamentos do poeta


Não há de faltar algum dia
angústia em teu caminhar,
e hás de sorrir, se sorria,
o ser que lhe ensinou a andar.
Não hás de ostentar nostalgia
se muito lhe falta de amar;
suporte, pois, toda alegria
que basta ao mundo por sonhar.
Nem hás de buscar a valia
valorando o vasto vulgar,
irás encontrar o que espia
no berço, por teu regressar.
Não há de faltar algum dia
suspiros por teu revelar,
e hás de chorar, se sorria
o ser que inventou poetar!

Homem evoluído


Apático e esquelético
dimetrodonte explanado
animado superior,
sou o que sou.
Monto-me no passo
na aurora vou, na evolução
sou o que é e sigo,
senhor do titã
medo do inimigo
mente desvairada.
Sou estranho
Sou a cruz
Sou a espada
sou despesa, não sou ganho.
Inconscientemente inescrupuloso
temperado da insônia
espasmando meus olhos,
hominídio infeliz,
assassino feroz!
A caça e
o caçador,
que sou doutor
que nada sou,
analisando, minuciosamente,
sei que sou.
Anatomicamente ajo
aparentemente penso,
soláspero arrepio
tenente reagir
expurgo de mim mesmo.
Que sou agora?

Pro-lixo


Quando assisti as velas antigas
no candelabro se demonstrarem
em tom Verano, ao Lá se calarem
os instrumentos sobre as cantigas,
repercebi desalmadas intrigas
(nem vós tem percepções melhores)
te vem sem medo ver meus lugares
e te limpas, do tédio, instigas!
Setembro, outubro, novembro
e lembro dezembro
e seus panetones,
me desce melhor um fondue.
De fato, minha liberté
jaz quente com minha fé
e toda letra a qual lembro.
Fustigas, inspiras, castigas
o bailarino e seu estandarte
sugando, lhe estrai a arte
e o nexo oposto ligas.
Larga isso aí!
Vai ser feliz,
ver a vida como é.
Ponha o chão no teu pé
e enrosque-te analfabetismo.

Nunca feche o cruzamento

Nunca feche o cruzamento,
recue às calçadas na viagem,
não há estrada
por onde há mato
Não há bicho após o ato,
há nada.
Vários instrumentistas sonham
o som cósmico, a juventude.
Dá a sensação dos movimentos
do mundo modificado:
a racionalidade, o poder, a emoção!
No muro de concreto, fractal, está escrito
o sumiço da noite no sertão de São João,
os suplícios que abolira a desventura.
A face do Sol da cidade da África do Sul,
os pretos azuis, o armistício,
a bienal dos artrópodes em ressaca,
o líquido cefalorraquidiano,
a lei natural dos filhos de José...
Havia uma vassoura segurando uma senhora
O reflexo do Brasil no asfalto,
degenerescência nova,
e um fevereiro eclesiástico.

Prime people


Do mundo o que é real não vive muito
para pictografar abutres.
Ante a imagem dos quatro ventos
a imagem negra crepita, gnóstica;
antes que os olhos flagrem, como vulturinos
a mão da morte assalta
mote, retina e chance
vão-se pelo pó da guerra.
Na terra de baixo a pele escoa
somente, calcificada
como os frios lábios desposados morrem
à plácidas dores suplantados,
resignam.
Nas entrelinhas de uma atitude pessoal
silencia o tempo e comem luz com a cara, paulatinamente
a ser vitória magnífica sobre mar e mangue
esmagando caranguejos, dia após dia.

A Capital


Quando fores para a Casa do Machado de dois gumes
compres um cofre para o teu dinheiro
um esqueiro para o teu charuto
uma luva para tuas mãos
e saliva para tuas leis.
Compres também seis tamancos para os átrios do palácio
e um gentil, que referende teu nome
pelos mármores por onde porás os pés.
Entretanto, Homero, é vã Creta,
pois se todo tanto intento é tudo tido
quem viu a barra do vestido
de Helena?
Então façamos assim: esqueçais tudo e fujais,
ao paraíso dos neandertais e mórbidos colossos ferve
um caldo que relaxa o corpo
para os que compram o caldo que relaxa o corpo,
longe da espúria plebe, nas linhas de montagem da felicidade alheia.
Quero que esqueçais teu filho, teu seio, teu fértil fruto
os setores das iniciativas privadas
os financiamentos, a especulação, a propriedade
a balança comercial favorável, a diplomacia, o poder bélico
as prerrogativas de campanhas progressistas e o Estado de políticas públicas.
Somente suma, em suma durma.
Sem perder, sem sofrer, sem pertencer.
Autoantropofágico, antropocênico, antropocêntrico.
Egoísta, antisincretista, sadomasoquista.
Para nascer e viver e morrer
na esquina das responsabilidades e cruzamentos de uma revolução caótica
Basta ser
E não ser.
Inútil ser.

O pico


Sou a neblina de um pico que em emerso
Monte, se estático uma aurora alcança,
Prumo-o à virtude tal que aos céus o lança
Por cume, dentre os cumes do Universo.
Ora, vergaram-me minha vida em nuança
Tão valente como um grão no ar disperso
Com fragrâncias a mais, de verso em verso,
E às crenças de uma prostrada esperança.
Caminhando no vento não ousei
Olhar para o que erige a caminhada
Ou para dentro do que sou e sei.
O grão não tornará morro sem nada
Que o faça persistir difuso à lei
Da solitude de uma madrugada.

Da falsidade das promessas


Postos nas mãos das pessoas que amamos
E já convicto não se pode dizer
Que com elas junto se pode ser,
Que somos quem seríamos que sonhamos.
Confia, e te basta um instante em sofrer
Penas, das juras que solenes damos;
E, quando pela decepção vamos,
Um não há que te possa o bem querer.
Diluir o peito, que em poeira será,
Das íntimas falhas a angústia clama
Sustenido amor, mas pranto virá.
Por nada que cesse em si se derrama
Eterno, eternamente verá
Incólume amor temperar tua lama.

Intruso degredado desse estado,
Distante da tormenta que se encerra,
Pudera eu ser melhor luz e pudera
Ser maior luz que a maior luz de um fado!

Pois quando quis ferir mais fui amado,
E em mim vi quando amei que o mau opera;
Enquanto o próprio peito são que era
Seu mote fez da vida contestado.

Na folha vaza o orvalho que estivera
Às mãos de Jove, à nau, em gota grossa,
Trasladou pela terra e aos céus volvera;

Também comigo o remorso remoça
Provando-me as virtudes por austera
Que estagnar destino se não possa.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Pêndulo

O pêndulo gemendo a traqueia invade
E faz-me mais covarde
Mesmo coragem abrangendo
Aqui.

Lá, tudo no quadro
É o poema em orvalho retratado:
Talhado
Sofrido
Julgado
Enganado
Não lido
Renegado,
Pelo seu ator amado. Entendido!

Os vivos não trazem a sorte pra perto,
Aqui.
Os vivos só fazem a morte, contínua,
Sorrir!
“Penso”, o peso propenso é o pêndulo: (para isso)
O peso
Propenso
É o pêndulo!
“E sim, breve existo.”

O coração de carbono

O abismo se aproximando...
Meu pensar, imaginar, vindo...
Vais tu, ó são peito, atropelando
E o carvão se acabando
Na ponta do lápis torto.

É o final: mira o chão!
A chantagem que vem me fazer morto.
Só corto as ligas da aflição
E seduz pular na boca do abismo.

Ah! Quão é mal morte ao coração
Que já é tudo o que me restou
Que me escala o diafragma
E que explode os meus pulmões,
Expelida! Expurgada!
É a fibra condenada
É o tudo que me restou...
Suspiro...escarro...ao abismo
Saltou.

Corredor

No corredor de corpos não passa nada.
Não passa nada no corredor!
Imenso...vazio imenso no corredor
Que não, já não passa nada.

Passa o vento no corredor
E um vulto a só procurando
Quem sabe, outro vulto, no corredor.

As luzes repentinamente se apagam no teto do corredor
Como se isso apagasse a imagem
De quem um dia lá passou,
Pisando seus frios mármores a sós.

A imagem vibra no fundo do corredor,
É só miragem das frações das vidas
Ou são só as danças das sombras...

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

À estrela

                                                                                Sugestão de trilha sonorahttps://www.youtube.com/watch?v=k1-TrAvp_xs

Além para as nuvens colhi meu amor
no leito celeste de cor a brunir;
repouses, pois saibas que irei te seguir
sendo para ti no inverno uma flor!

Prometo-lhe amar por só bastar sentir,
sussurro-te e arranco do peito o fulgor
que em dois corações se demonstram maior,
maior se seriam se amarem se unir.

Nascestes dos céus contornando o instinto
selvagens, implícito em meu peito e hei
de ser novo homem contigo, e não minto!

Ou morro sozinho e ao céus subirei
mudando palavras num sonho onde sinto
saudades do beijo que lá lha darei.

Morro feliz

As crianças descem na noite a peça
para compor o labor do dia
para fazer a venda,
Os sacos que pesam sobre o sono
são os sonhos dos mulatos recobrados,
é a alma que transcende da gente!

Há de se admirar o povo
que é homem mais que o homem e não simples
pois que tudo se atraca em sua vida.
Em sua vida tudo é tarde, por exemplo,
e o exemplo que lhe cobra a tudo arde
arde a jornada comprida.

As crianças do gueto nunca dormem
sonham sonhos sob sonhos
e os sonhos são as sínteses que sobram
do silêncio de uma imagem de quem dorme.

Os pretos não comem.
Param o ponto no expediente
pensam, não pensam, padecem poentes
parecem pacatos pobres, e o preto não come.

Simultaneamente morre,
no momento presente,
o ser daquele que pulou longe
da encruzilhada favela.
Lá, quem vem na ginga é só quem morde
as rédeas de zinco e ladeira
e passa fome.

A moça equilibrista guarda o morro
modela a paz no canto
E as crianças vivem melhor.
O suor da preta escorre pela pedra
no rosto que remoça o medo,
o escuro manto,
a chuva deixa densa relva...

No dia de São Jorge a alegria!
ávido nasce no côncavo o povo da favela,
o morro acende as luzes e ascende
O samba!
O preto larga suas chagas
a moça pões a saia estampada
as crianças sonham de brincar...
E desafia-se intrépido a lua
que se vai, na cadência da cintura,
em cordões de estrelas cósmicas, pequenas:
Pequenas aos olhos do morro!

A vivenda da gente que não é simples
é torpor e torpor e sorriso.
É o santo que escala as pedras, sobe a viela e bate panelas
para alimentar as bocas famintas.
É o ciso que reclama o terno direito
que exclama no peito de Ogum, com clavas ocas,
pela saúde do pretinho que dorme.

Retrocesso

                                                                               Sugestão de trilha sonora https://www.youtube.com/watch?v=8k41D9por6c

Aos pontos tortos remimos
rumo à nossas dores todas
e para tudo o que vimos,
(daquilo que somos nós)
voltamos à terra de nossos avós
voltamos à guerra.

Amigos indispostos, supostas sequelas
à dilaceração do ameno amor
pelas batidas do coração,
o retrato da dor em vão
o arrependimento...

Quando voltarmos sobreviveremos
do pó de nossas estradas
do nada, que a mais seremos.

E, se ainda em vias atreladas
ingrata à descontínua foz de sermos,
será nada a beleza floreada.

À morte das sutilezas
regressaremos justapostos, senhores,
à mão coesa!

Da adolescência o langor e discrepância
pelo tempo a arrogância
e o pedantismo das certezas.

Vê-se que se cresce, enquanto morre
o menino que em mim dorme,
o gume que me lesa;
Do amor que ele leva
pétalas se escorrem
Com o vento que tudo some...

Vê-se que se mata enquanto é homem
no mundo das mortalhas magníficas
e dos fados e dos fardos dos covardes,
De um tango antropofágico
para os que se comem.

Os cacos

                                                                                Sugestão de trilha sonorahttps://www.youtube.com/watch?v=SRmCEGHt-Qk

Saltavam, dançando o desespero da morte
logo àquele momento prestes a esperança por vir,
veio nada.

Não vi amor,
as queixas de saudade
amálgamas da paz,
que a todos que não merecem contrai
desatinou-me completo pela noite a lembrança...

Num vórtice catatônico de ideias
desceu-me as contradições da vida:
A alma rasgada é perfeita,
embora ferida;
A linha do tempo é estreita,
embora comprida;
O sonho é a história não feita
embora já tida.

O saprófago me corteja ao sarcófago
e me leio:
Homicida.

Ao meu destino

                                                                                Sugestão de trilha sonorahttps://www.youtube.com/watch?v=3G4NKzmfC-Q

Escrito está com novos traços
a fiadura de meus passos
a minha cura.

Rolava no ar, alçando compacta
os pés pelo chão e fátua
tornou-se escura.

Assídua se acanhou nas horas
perplexa a maga senhora
disléxica continua...

Seu som não retumbou no vento,
sua alma não teve o unguento
que mora morrendo na rua.

Lhe vejo que está só e aflita
seu senso, contudo, me fita
contido na sua.

Às vezes a encontro tão cálida
em ares de quem se quer pálida
morando na Lua!

Faz, que te faço mais e e alegro,
integre-me que lhe entrego
um beijo na boca tua!

E cai-lhe tão bem teu caminho,
tu, que embora o tenhas sozinho,
poética perpetua.

Que tenhas sozinho ele enfim
conquanto que tenhas em mim
o leito cujo amor flua.

Porque desejo

                                                                             Sugestão de trilha sonorahttps://www.youtube.com/watch?v=VbxgYlcNxE8

Desejamos,
que grande maldade que somos.
No silêncio da madrugada.
No silêncio da natureza.
No silêncio não somos nada
que pareça a parte do silêncio.

Se somos mais que silêncio
do preceder de gritos,
de sentir a mortalha,
não somos feitos de não feitos
mas feitos somente quadros queimados, por todos os lados,
por sopro de vida e poeira:
Pó para os meus desejos!

A maldade de ser, pois de ser
maldade porque
queria o sopro me ter maldade,
Por ter a parte de toda bem
o atino para a vida em som,
roubar da natureza o tom
roubo muito bem...

Desejo-lhe ter maldade
e a onda elevar teu posto
trinta mil anos após
de desejar um beijo para havermos
de ser mais que o mau silêncio, sentimento
Desejemos.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Via crucis

                                                                      Sugestão de trilha sonorahttps://www.youtube.com/watch?v=aCFnzSCzoYA

Na cidade se integra lixo:
canteiros aterrados,
surpreendentes furtos
sorrisos curtos,
medo fixo.

Dentro do meu quarto e o progresso tecnológico
um ser escatológico
se engendra.

Recrudescendo
aos poucos vai meu sentimento
pelos pés da multidão ornamentada
e irizado um câncer na alma, pela maligna ira
que um cão velou soldado, meu sufoco, ainda respira.
E no raso escuro de toda a treva
um grito que vara o horizonte,
subserviente Anacreonte,
arpoa Eva.

Aos poetas que contemplam estrelas de um céu inóspito
morrerão, desnudos diante à noite,
pois que o dia é um raio açoite
a prorrompe-las...
Pois que sozinhos - os anticristos -
manifestos na rua vaga
Tão calados e distantes sobretudo.
Sem nenhuma chance.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Toda melancolia

                                                                                 Sugestão de trilha sonora: https://www.youtube.com/watch?v=vQVeaIHWWck

Haverá, senhora, o tempo em que dirás nunca.
Se algum torpor abraçar teu peito
Se estiverdes certa do quando podes ser triste,
Dirás nunca à melancolia...

O teu filho partirá teu corpo num suspiro ágil
E quando a febre lhe atingir misteriosamente
Lembrarás do nunca, eu imagino
Quando perderes o orvalho numa folha de figo.

À tua mão a réstia de um fogo breve
E pelos pés num manto o acúmulo de fracassos,
Então virás a mancha da agonia...

Pelas ruas o assombro parte em frente à tua vida
E se se lembras do quão nunca é todo pranto
Desvelar-se-á a morte em sincronia.

Último canto

                                                                                  Sugestão de trilha sonorahttps://www.youtube.com/watch?v=39DNaNAMKAU

Aqueles que perduraram até o tempo presente
Aparentemente diferem a lágrima
dos povos todos, da estática aurora,
e se incrementam compilados no nada.
Há de se glorificar a moça
que, de um remorso cativo,
subjetivou o estorvo sobrevivência.

Quando a escuridão pairou sob os lares
nenhuma alma inquieta sorriu.
Um hino não ressoou
Não viram a dor entrar, na periferia sólida
por dentro do peito um sorriso
morria murcho.

Um ébrio saltou à esquina, e caiu
perante esforços vagos de recuperar suas chances,
quando lâminas de sangue surgiram do céu
ninguém dormiu.

Os inocentes temiam a morte, temiam amar o mundo
Mas agora, que o têm,
primam pela força violenta,
só agora o movimento é uma rocha infante
Significante, significativo estuporador de momento.

Seu capital comprou as ilustres praças
e nenhum galho tornou ao fronde
de onde partira, extasiado.
Só não roubou a letra que desceu firme no enfado último, suspiro austero
quando os grilhões sedimentaram o vento
e, melancólico, rasgou a terra...
sob os túmulos plantados eternamente permanecemos.

Perfecto

                                                                                  Sugestão de trilha sonorahttps://www.youtube.com/watch?v=MPvS0g2papI
                                                                                                                  
                                                                                                                 “Inter peritura vivimus"
                                                                                                                                             Sêneca
Era início da autópsia. A diploide
Obstipada em contato ao pterígio
Em secreção do constante fastígio
Do endomísio ao linfoma à tireoide...
            
No trauma, a bifurcação no basilar,
O periósteo infindo ligando o lienal
Senil; no pênis, do apetite sexual,
Cravada a decídua deixou-se encontrar.
            
Das mucosas e sebáceas laríngeas
No epicôndilo, que já em hiperplasias,
Pariu-se as teralogias esfígeas.
            
Há exsanguinotransfusão em herniorrafias
E, no precórdio, a hipófise que tinge-as
Do encéfalo, com sangue de hemorragias.

Cabelo

Todos acham, nos fios de suas belezas,
O cabelo negro e fosco:
No olho dilatado ofusco
A tristeza de todas as tristezas.
            
Me parto inteiro de impurezas,
Castigo o ato maldito de mastigar
O nutriz do viver, sustentar
A gordura ao invés das magrezas.
            
Enquanto vou vivendo elástico e afore,
Como um passageiro sem hora nem data,
Meu rústico cabelo morre...
            
E vai ficando branco e prata...
Falsa anomalia coliforme,
Gélida vida que se mata.

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Os estelares

                                                                                 Sugestão de trilha sonorahttps://www.youtube.com/watch?v=z_dEGxRs3lU

Somos estelares, menina,
Numa estética modernista
Ultrapassando vicissitudes
e consumindo conquistas.
Para trás os corpos todos
dos que ontem foram
para o mundo e não são mais
animados, animais.

O passo da alvorada ao nosso alcance
Um reflexo do tempo num relance
e já nada nos mais pertence,
senão um trágico empirismo.

Do universo teço um céu de rotas,
Crio contigo um paralelismo.
Num altruísmo
fulgura a face de Deus!

Pelas batidas do coração caindo vamos
perdendo a guerra injusta,
e a capacidade engajada à palma
escorre pelo chão dos lares.
Certamente não choramos – os estelares
- sumimos, confluentes nos clamores
por não clamares.
As coibições, confissões latentes, menina,
as lutas superiores
Pela memória das gerações
Esquecer-se-ão delas.
Mas as estrelas se apresentam pelo quarto crescente
à todas as cortes de lembrança ao céu
e o horizonte se espelha nas mãos.

Somos todos estelares
só que alguns mais, outros menos,
por isso morremos
e vivemos dores.

Não somos atores
Não somos o que temos
Não somos flores.

Não somos mais nem menos
Não somos o que queremos
Não somos amores.

Somos estrelas maravilhosas
que de uma noite frondosa
romperam!

Cadentes, nas entrelinhas,
umas caíram sozinhas
outra caírem esperam.

As estrelas tortas, do esquecimento,
desses pontos luminosos a traçarem curvilíneas,
a noite, de porta em porta
pelo pálio descendentes, do cosmos e, de repente
aborta.

Enamoradas se entregam
arremedam ilusões,
Os estelares são clarões
para os que a musa enxergam.

Adornando a paisagem
cinematograficamente bastam,
Por fagulhas de dureza bélica
as estrelas são trágicas.

Fatídicas, enigmáticas:
a semelhança do que é entrega
ao contrariar a náusea
da mortalha que se carrega.

Somos todos estelares, menina,
ofuscados eternamente
pelo sol da senda cega
e o tempo que determina
quem ascende e quem se inclina
quem deveras dor não sente.

Et transite vobis dignus

                                                                                 Sugestão de trilha sonorahttps://www.youtube.com/watch?v=k1-TrAvp_xs

A nós, que somos forjados na dor,
acostumados a sofrer diariamente
em formas avulsas sutis,
nas árduas culpas remanescentes.
Ainda não provamos da angústia!

Portanto trate-me assim como tu tratas
O pó, que do vento vem de leve
acariciar tua alma.
Portanto não me dirija palavra
que ponha-me ao chão de novo
ao revés de um estranho sonho.

Antes de ter por tudo, lhe dizer quero:
Prefiro ofertar-lhe o desespero
que furta-me e o remédio
do estuporador caminho.
Pelas cruzes que levamos
E que, ser acreditamos,
Sustentáculo da vida!

Assassino do abstrato,
Construí as minhas linhas
suplicando a recessão
da dor do físico fato.

Justificas-me ao nada estar atento
pelas vozes que sussurram dissabor
às suas quimeras.

E no que me dá querida morte fria
Que me apraz somente tê-la em alegria
Sendo-a como não se pode ser com a vida?

Me sufoco na cadência desprovida,
para só, por ti, sorrindo ser saída
pela morte em minha branda nostalgia.

E renasço e vou ao ventre e vou não sendo
o pecado desvairado pelo pranto
pelo golpe que não vai mais se doendo...

Vejam todos que vivi aquele tempo
Mas me agora não há tempo senão quando
O tempo em que estou morrendo.

Passagem

                                                                                 Sugestão de trilha sonora: https://www.youtube.com/watch?v=-l5Zc_kEsM8

Quem canta haverá de temer o destino
por quanto teu canto logrou o desgaste
e ao tempo ameno se lhe acostumaste
do tempo, portanto, lhe virá o atino.

Dolentes supondo-lhe outros olhares
do que eras contente com tudo do antigo
Que crépido fogo levara consigo,
Mantém rés a chama nos teus calcanhares!

É breu a colheita provinda do vento
Que ao vil se assemelha também e amiúde
Refrata o cativo na parte por cento,
dolorosamente refrata a saúde,
vagarosamente dilui o talento.

Chorar o amante na relva a beleza
recruda das flores, nênia à primavera,
doando-se à morte no hirmeneu que espera
roubar-lhe funesto a alma em tristeza.

Não mais Fornarina discende a riqueza
da lira que d’antes vibrante cantaste
à vida, ao mar, ao sonho, à pureza;
Teu pranto tresanda em torpor e dislaste:
a morte, a terra, o fundo, a frieza.

Se agora tão basta a fortuna incessante
Anátema austero a tudo recrudesce
na aurora cadente de um fado oscilante,
que pela virtude em proporção merece
o golpe contínuo da dor sopitante.

Calado pobre e glorido do nada
Às brumas que encolhem seres a pluma,
À escuma que lembra Andrômeda atada,
À vida que entre todas é mais uma,
À nau tenente e próspera afundada,
À luz que se ofusca da luz suma.

Insípida esperança jaz acabada,
Embora se demonstre a plebe expúria,
Impossibilitada é tua fúria
e tua atividade exonerada.

Fustigas agora com teu ventre morno
de ódios sustém-se para se conter
no lastro senil da fama a prorromper
a queda fatal do penúltimo adorno.

E quando restringes teu leito à deriva
à nau, doravante se crava em teu seio
nos poucos instantes que tua alma é viva,
sombras entrepostas num largo enleio,
vulturino vulto que em veloz esquiva
delira errante tenaz devaneio...

Os baques constritos rugindo constante...
O som da mortalha roendo-lhe a parte
da carne, do carma, do amor e da arte
e tu não é mais que um instante.

Bem vindo médico cubano!

Mais um ano nas quebradas
Esplanadas, como ontem,
Condenadas, sem que contem
Um quebrado ser humano.

Ele veio hoje e sempre
Será bom para com eles,
Como foi bom para aqueles
Tingindo seu branco pano.

E com sangue e seu suor
Fez das tripas artifícios
E corroborou indícios
De ser de todos hermano.

Seja honra à criatura
Que lhe vem para curar
A malícia pelo amar
Te tornando mais cubano!

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Tragédia

As emoções não iam bem àquela noite. Ele, sentado no banco do camarim, com as pernas cruzadas formando um triângulo minuciosamente geométrico, lhe custando à postura, o qual, em seus pensamentos desvairados de pormenores erros. O desgosto o clamava austero e um copo entornava afoito. De fato, o suor tingia a maquilagem ainda que perfeitamente elogiável... Ora, o sangue de artista corria mesmo em suas veias! Seu passado glorioso o inflava de sagacidade e, como sempre, estruturava-se filiformemente um anseio pelo povo. Mas algo o mudara recentemente, sentia arrastada a vontade e ao sentimento surgia profundo o desejo de saltar. O espasmo tingiu-lhe por derradeiro e assim se foi meio copo. Ardente desceu-lhe a garganta e a saliva não era mais água, seu corpo não era mais pó; o triângulo contorceu-se em viravoltas sopitando o homem altruísta, mas como lhe ardia à garganta! Rodopiou, nos vórtices coloridos de um paralelismo simétrico, rasgava a rotina, abria e fechava os olhos ao ritmo do tango que se fazia ouvir dos palcos. Estirou sua cama num celeste pálio, colheu das nuvens o fruto e flutuava, até então, sob um chão movediço de felicidade. Aos poucos brotavam risos descompromissados provenientes do que se podia ouvir da plateia, era livre, pois que de tanto engastou seu último gole, para o líquido com ele respirar... Um, dois, um, dois... Ao passo que engendrava um lar à encosta pelo topo de uma palmeira, logo acima do Sol, com tábuas e cordas e as fibras mais densas do seu coração... Um, dois, um, dois, um, dois... Fluía então, voava, saltava distante enfim! À altura pela vista do bosque que arquitetara lhe era tangível um arco ponteando a noite com Deus e o éter entre um imenso abismo. Pois não hesitou, findou-se a haurida harpa dos acordes badalados logo que forjada fora a lembrança de sua senda; espirituosamente acariciou a ave que sempre lhe acompanhara pelo modo como desatou a gota dos olhos, os pés se despediram do chão e cálida a garganta rompeu-se em nó, a cortina se abriu.