As emoções não iam bem àquela noite.
Ele, sentado no banco do camarim, com as pernas cruzadas formando um triângulo
minuciosamente geométrico, lhe custando à postura, o qual, em seus pensamentos
desvairados de pormenores erros. O desgosto o clamava austero e um copo
entornava afoito. De fato, o suor tingia a maquilagem ainda que perfeitamente
elogiável... Ora, o sangue de artista corria mesmo em suas veias! Seu passado
glorioso o inflava de sagacidade e, como sempre, estruturava-se filiformemente
um anseio pelo povo. Mas algo o mudara recentemente, sentia arrastada a vontade
e ao sentimento surgia profundo o desejo de saltar. O espasmo tingiu-lhe por
derradeiro e assim se foi meio copo. Ardente desceu-lhe a garganta e a saliva
não era mais água, seu corpo não era mais pó; o triângulo contorceu-se em
viravoltas sopitando o homem altruísta, mas como lhe ardia à garganta! Rodopiou,
nos vórtices coloridos de um paralelismo simétrico, rasgava a rotina, abria e
fechava os olhos ao ritmo do tango que se fazia ouvir dos palcos. Estirou sua
cama num celeste pálio, colheu das nuvens o fruto e flutuava, até então, sob um
chão movediço de felicidade. Aos poucos brotavam risos descompromissados
provenientes do que se podia ouvir da plateia, era livre, pois que de tanto engastou
seu último gole, para o líquido com ele respirar... Um, dois, um, dois... Ao
passo que engendrava um lar à encosta pelo topo de uma palmeira, logo acima do
Sol, com tábuas e cordas e as fibras mais densas do seu coração... Um, dois,
um, dois, um, dois... Fluía então, voava, saltava distante enfim! À altura pela
vista do bosque que arquitetara lhe era tangível um arco ponteando a noite com
Deus e o éter entre um imenso abismo. Pois não hesitou, findou-se a haurida
harpa dos acordes badalados logo que forjada fora a lembrança de sua senda;
espirituosamente acariciou a ave que sempre lhe acompanhara pelo modo como
desatou a gota dos olhos, os pés se despediram do chão e cálida a garganta
rompeu-se em nó, a cortina se abriu.
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