segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

O poeta escafandrista

Para o fundo, imergindo em águas
Cautelosamente escrevo louco
Engrenando o enigma obtuso;
Vejo que também vi, confuso,
Protuberâncias inextricáveis.
            
Os ossos da mão são coisas palpáveis
E os homens desagradáveis,
De seu uso tenho só o uso
De experiências ineficazes.
Mas se escrevo sinceramente
Me percebo tal como o ente
Social dos insociáveis:
Com o ar puro do sentimento
Me visito solenemente!
            
Como, pois, pode aí ter
Existência do que é não ser
Substância, como é o osso,
E vagar com o que é sofrer
Soçobrando-me ao prorromper
De espreitar paixão que não posso?
            
Visitar-me implica-me mais
Forte esforço de meu trabalho
E braçadas vitruviais
Espelhando o celeste pálio,
Ressoar-se-á levemente
Na palavra proveniente
O fulgor dos meus ancestrais!
            
E expulso, serenamente
Presto, o ente que de repente
Crava as garras em meus umbrais
Que, na angústia eternamente,
Vive às velas do inconsequente
Leitor que não virá jamais.
            
Posso então ressurgir do fundo
Tendo em mãos liras cordiais
È paciência que fita o mundo
E tocar como se apraz
Ao humano ineficaz,
E pensar que mudarei tudo...
            
Triste sou dos mais tristes mas
Libertado por poesia!
E me afogo, como dizia,
Em pensamentos desiguais,
[pois sustento a emoção singela
De me ater e atracar-me nela
Indo a dentro em mim p’ra não mais.

Nenhum comentário:

Postar um comentário